
Temperaturas de Serviço
É do conhecimento geral o que existem temperaturas recomendadas para ser consumido cada estilo de vinho. Haverá motivos para isso acontecer? Também tem havido com cada vez maior frequência uma preocupação com essas temperaturas. Haverá motivo para tal acontecer? Como diz o ditado popular não há fumo sem fogo pelo que iremos explorar os motivos por detrás destas recomendações
Porque é que se passou de aquecer o vinho tinto para o arrefecer?
Há três décadas era habitual ver-se nos restaurantes mais requintados ou em almoços e jantares em que se pretendia impressionar ou considerar os convidados, aquecer-se o vinho tinto antes deste ser servido. Com regularidade o vinho era colocado ao pé da lareira para o fazer. A técnica intitulada chambrear tinha ido buscar o seu nome à palavra francesa chambre (quarto). Numa tradução literal poderá ser traduzido como colocar o vinho à temperatura do quarto. Atualmente tal já não sucede ou é muito raro. O motivo para isso acontecer é que os quartos (salas) onde os vinhos são consumidos serem mais quentes do que eram há mais de um século, altura a que remonta a prática de chambrear. Nessa época o isolamento térmico não era tão bom e a maior parte das casas não estavam aquecidas. Mesmo o Palácio Real dificilmente teria uma temperatura no inverno que chegasse aos 18 ºC. Ora, a temperatura recomendada para beber um vinho tinto é entre os 16 ºC e os 18 ºC Por aqui se entende a necessidade de antes ser necessário aquecer o vinho. Por outro lado, principalmente nas grandes cidades é comum, e nos restaurantes praticamente sempre acontece, que a temperatura ambiente seja superior a esses 18 ºC pelo que se compreende a necessidade de baixar a temperatura do vinho tinto antes deste ser servido. Entende-se também o porquê de durante as últimas décadas do século passado o vinho tinto poder ser servido à temperatura ambiente pois nessa época era a mesma do que a recomendada para esse perfil de vinhos. Agora, cada vez mais, o ideal é arrefecer um pouco o vinho tinto.
Quais são as razões para um vinho tinto ser servido a uma temperatura superior à de um vinho branco?
Os vinhos brancos e tintos diferem em algumas características para além da cor conforme foi referido no texto “Como provar vinhos passo a passo”. Uma das mais importantes para definir a temperatura de serviço é a adstringência conferida pelos taninos, bem mais presentes nos vinhos tintos do que nos vinhos brancos, onde só são notórios em situações excecionais, nomeadamente quando houve uma maceração pelicular prolongada, como acontece nos Orange Wine e em vinhos vinificados em ânfora. Na Sala de Prova, pode, por exemplo, apreciar o Poças Fora da Série Orange Wine, que tem estas características.
Experiência 1: Um vinho tinto servido a diferentes temperaturas
Porém, o que é interessante explorar é o fato de a adstringência ser mais sentida a temperaturas baixas do que a elevadas. Trata-se, aliás, de um dos fatores principais para que os vinhos tintos sejam servidos a temperaturas mais elevadas, a fim de atenuar a sensação de adstringência, o que não é necessário nos vinhos brancos por praticamente não terem taninos. Em casa, pode-se fazer a experiência de colocar um copo de vinho tinto, de preferência encorpado, no frigorífico, outro no micro-onda (cuidado para o copo não quebrar!) e, finalmente, um terceiro à temperatura ambiente. Depois dos copos estarem com temperaturas diferenciadas, prove e verifique em qual deles sente mais a adstringência, o teor alcoólico e a maturação da fruta, assim como, qual o vinho que tem melhor equilíbrio entre a qualidade de aroma, acidez, a adstringência e álcool. Em teoria, no copo que esteve no micro-ondas, deve notar mais álcool, uma fruta mais madura e adstringência mais suave. O vinho com melhor equilíbrio será o que se manteve à temperatura ambiente, mais próxima da temperatura recomendada para beber vinho tinto. É um vinho em que os aromas não são sobremaduros, tampouco vegetais. Tem um bom equilíbrio entre a adstringência e a acidez com o álcool.

Experiência 2: Um vinho branco servido a diferentes temperaturas
Outro fator a ter em consideração e que leva a que os vinhos brancos sejam servidos a uma temperatura mais baixa é a sensação de acidez aumentar em sentido inverso da temperatura, ou seja, num vinho frio, a acidez é mais notória do que num vinho à temperatura ambiente. Como os vinhos brancos não são adstringentes, necessitam de realçar a acidez para conseguir equilibrar com o teor alcoólico. Por sua vez, deteta-se menos o alcool quando o vinho é servido a uma temperatura inferior. Pode fazer uma experiência equivalente à que fez com o vinho tinto, neste caso com um vinho branco, mantendo os cuidados. Verifique onde é mais evidente a acidez, o teor alcoólico e o tipo da fruta que surge em cada um dos copos. Em teoria, a acidez é mais marcante no vinho branco que esteve no frigorífico; o teor alcoólico nota-se menos nesse copo. Os aromas serão mais elegantes, florais e cítricos. À medida que vamos aumentando a temperatura, o vinho vai-se tornando mais flácido, com aromas mais pesados e alcoólicos.

Temperaturas recomendadas de consumo
Com as considerações acima realizadas, será mais fácil compreender o motivo pelo qual os diversos tipos de vinho devem ser consumidos a temperaturas diferentes.
Abaixo irão elencar-se as temperaturas que habitualmente são recomendadas para o consumo em função do tipo de vinho. Porém, deve ter-se em atenção que as temperaturas são recomendadas para o consumo. Ou seja: a temperatura de serviço poderá ser sempre um pouco abaixo da aqui indicada. Partindo do princípio que se encontra num local com temperaturas superiores à temperatura recomendada para consumo. Vinhos cuja temperatura divirja mais da temperatura ambiente devem ainda ser mais arrefecidos (em relação à temperatura recomendada) do que aqueles que se sugere o seu consumo a uma temperatura próxima da ambiental.
Com exceção de onde mencionado e fundamentado, as temperaturas são as recomendadas pelo Court of Master Sommeliers[1], a entidade máxima de formação de sommeliers a nível mundial.
Tipo de vinho | T (ºC) | Observações |
Vinhos de colheita tardia e outros vinhos brancos doces. | 6-8 | A doçura é atenuada por uma temperatura mais baixa. |
Licorosos (quase) secos. | 6-9 | Ex: Fino (Jerez) e Sercial (Madeira) |
Espumantes e Champagne | 6-12 | Mais doces, mais frios. Mais secos, complexos e/ou de melhor qualidade, mais quentes. |
Brancos ligeiros e rosados | 7-10 | Rosados doces, mais frescos. |
Brancos encorpados | 10-13 | Estágio em madeira e com fermentação malolática. |
Licorosos doces com estágio prolongado em madeira. | 10-14 | Ex: Porto Colheita (branco e Tawny), Malvasia (Madeira). |
Tintos frutados ligeiros | 10-13 | Sem ou pouca adstringência pelo que têm a mesma gama de temperaturas dos brancos encorpados. |
Tintos com adstringência moderada, incluindo tintos envelhecidos | 14-16 | Ex: Borgonha |
Licorosos tintos encorpados com a adstringência elevada | 15-17 | Porto Vintage e Late Bottled Vintage |
Tintos encorpados com adstringência elevada | 16-18 |
Notas adicionais:
As temperaturas recomendadas dos licorosos doces são abaixo das prescritas pela Court of Master Sommelier, pois uma temperatura mais baixa diminui a sensação de doçura e álcool, e aumenta a sensação de acidez. Como são vinhos praticamente sem taninos, não existe problemas de realçar a adstringência, até por os vinhos Madeira de estágio prolongado serem habitualmente produzidos a partir de uvas brancas, como é o caso da Malvasia. O mesmo se passando com os vinhos de Jerez doces.
Foi ainda feita outra ligeira alteração em relação às temperaturas prescritas pelo Court of Master Sommelier em todos os vinhos tintos. Entende-se que vinhos tintos com a adstringência moderada deverão ser servidos a uma temperatura inferior à habitualmente recomendada, de 16 a 18 ºC. Por não serem tão adstringentes, a uma temperatura mais baixa ganham elegância. Contudo, deve-se ter em atenção que, se forem vinhos tintos envelhecidos com aromas muito delicados e frágeis, devem ser servidos a uma temperatura ligeiramente superior para que estes sejam realçados. O mesmo acontece para os licorosos tintos, como um Porto Vintage envelhecido.
O Court of Master Sommelier é omisso relativamente aos vinhos licorosos tintos encorpados com a adstringência elevada. É importante dizer que a recomendação é que estes sejam servidos a uma temperatura ligeiramente inferior à dos outros vinhos tintos encorpados, devido ao desejo de atenuar o seu grau de doçura e teor alcoólico.
Conclusão
Seguindo estas recomendações, poderá tirar o maior partido dos vinhos. Além disso, poderá sugerir aos seus amigos o que devem fazer quando os receberem em sua casa, mesmo que estejam num ambiente muito aquecido.
Todavia, fazemos uma última recomendação: vá à Sala de Prova e aprecie os vinhos que se encontram à sua espera, guardados às temperaturas recomendadas, para que possa tirar o maior prazer dos mesmos num ambiente acolhedor, elegante e com uma das melhores vistas sobre o Porto.
Desejamos-lhe umas ótimas degustações.